Vivemos numa altura em que cada vez se fala mais de sexualidade e prazer, em que se multiplicam os podcasts, webinars e publicações nas redes sociais sobre o tema, em que os pedidos de ajuda no âmbito da sexualidade e consultas de sexologia são cada vez mais frequentes.
Não obstante, uma questão se coloca: estarão as pessoas mais conhecedoras da sua sexualidade, mais empoderadas e responsáveis pela mesma?
Se há quem não se coíba de falar abertamente sobre estas questões, entre o círculo mais fechado de confidentes, há outra parcela de pessoas exatamente com as mesmas problemáticas, dúvidas e apoquentações, e cuja procura de resposta se mantém silenciada.
Aí, surgem os pensamentos nublados e escurecidos do “Será que me vão julgar?”, “Ai, o que vão ficar a pensar de mim?”.
Inseguranças todos temos, mas até que ponto limitam a vivência dos nossos relacionamentos?
A sexualidade e a psicologia
A ciência psicológica tem-nos mostrado que os estereótipos relacionados com a sexualidade, construídos socialmente e ao longo da vida, e que se encontram internalizadas no ser humano, podem refletir-se no comportamento e funcionamento sexual dos indivíduos (Nobre, Pinto-Gouveia & Gomes, 2003). A verdade é que a maior parte das pessoas apenas tropeça neles quando surge um problema ou quando esse mesmo problema começa a afetar a relação ou até impede de se relacionar sexualmente com alguém, até consigo mesmo!
Raramente, as crenças que orientam os nossos comportamentos dão lugar a pensamentos como “Toda a gente tem os mesmos problemas. Fala-se de burnout, depressão e ansiedade. Mas afinal qual é o problema com o sexo?”.
Dos meus anos de prática na área da incapacidade, no meio de tantos assuntos difíceis a falar com famílias e cuidadores, a sexualidade era certamente uma não conversa, quase como se aquelas pessoas não tivessem direito a ela. O quê? Pessoas com incapacidade física e intelectual com desejo sexual? Idosos também?
A educação sexual nos mais jovens
Para que exista e se mantenha a saúde sexual, os direitos sexuais de todas as pessoas devem ser respeitados, protegidos e realizados (WHO, 2006). A Declaração dos Direitos Sexuais pela Association of Sexual Health (2015) deveria ser falada nas nossas salas de aula, de estar, de formação e de trabalho, à semelhança dos direitos humanos.
A educação sexual deveria fazer-se também em casa, mostrando aos filhos que há espaço para falar sobre o tema, sem estigma, sem vergonha ou negação. À semelhança da literacia financeira e digital, responsabilizamos a escola sobre um dever que deveria ser partilhado connosco, pais: sermos mais participativos e interessados em debater e questionar os nossos filhos sobre o seu corpo, sobre dizer não e sim, sobre a sua sexualidade, mesmo quando eles desconversam e olham para o lado.
Os pais também passaram por isso, lembram-se? Que tal darmos um passo à frente e começarmos por falar-lhes dos nossos receios também? Dos mitos e estigma que ainda existem?
Das personagens do macho latino, da mulher submissa e recatada, às crenças de que a masturbação é para ficar em segredo, de que um verdadeiro homem está sempre pronto ou de que é errado dizermos que não nos apetece sexo sem preliminares. A lista de condicionantes na sexualidade é tão extensa e diversificada como a história de cada um de nós. Todas elas nos acompanham até ao quarto (ou outro local que vos aprouver) e moldam a nossa intimidade, a forma como nos relacionamos com o nosso corpo e com a sexualidade. Acompanham as pessoas no resgate do seu prazer, do prazer do outro, do seu prazer com o/a outro/a e do seu prazer consigo mesmo.
A descoberta e a exploração do seu corpo e do corpo do outro deve ser agendada com alta prioridade nos nossos calendários. Agendada com tempo e local definidos, com compromisso e um mindset onde o julgamento dá lugar à aceitação e ao prazer.
Não sabemos quanto a vocês, mas o prazer foi todo nosso!