Recentemente, muito mais se tem ouvido falar de saúde mental e, com isso, vamos conhecendo melhor como e quem está a ser mais afetado por problemas do foro psicológico. Se a preocupação e incidência surge um pouco por todos os espectros sociais e faixas etárias, uma das populações que mais alarme faz soar são os jovens estudantes universitários.
Esta preocupação deve-se à prevalência cada vez mais elevada de perturbação psicológica: cerca de metade, dizem estudos recentes, têm sintomatologia grave; à sua gravidade e, também, às consequências (ex.: burnout académico) que tal poderá ter a curto e médio prazo numa fase da vida crucial destes jovens.
Muitos desafios na transição para a vida adulta esperam estes jovens e os fatores indutores de stress aumentam: começam a perspetivar o seu futuro profissional e as oportunidades de realizar sonhos e objetivos pessoais e profissionais; torna-se cada vez mais necessária a autonomização em relação aos pais; pode haver um maior afastamento em relação à família e amigos quando vão estudar fora; surgem, muitas vezes, dificuldades decorrentes da construção e definição da sua identidade e maiores desafios no estabelecimento/manutenção de relações afetivas significativas.
Sendo esta construção de identidade, por si só, uma das etapas mais relevantes do seu desenvolvimento e que mais transformações acarreta ao nível de “atitudes, interesses, valores, planos de futuro, aspirações, gestão de emoções, integração pessoal e competência intelectual” (Pascarella & Terenzini (2001, 2005) in Dias, D. & Sá, M. J., 2013), juntar outros aspetos críticos de mudança a este processo aumenta significativamente a sua complexidade.
Principais causas que afetam a saúde mental dos jovens
É sabido que é nesta fase da vida que esta população está particularmente vulnerável ao surgimento de algumas das perturbações mentais mais graves, como sendo a Depressão, Esquizofrenia, Perturbação Obsessiva-Compulsiva, entre outras.
Entre as problemáticas identificadas como mais comuns estão:
Principais fatores de stress nos jovens
Existe um conjunto de fatores que foi identificado como os principais motivos que levam um estudante de ensino superior a desenvolver comportamentos de stress, como:
- deixar a casa dos pais e viver num ambiente novo
- partilhar casa com novas pessoas
- dar resposta às expetativas próprias e às dos pais
- manter relacionamentos à distância com pessoas significativas
- problemas financeiros
- competição entre pares
- problemas relacionais e necessidade de integração no grupo de pares
- dificuldades em organizar o tempo
- preconceito étnico ou subcultural
- maior consciencialização da própria identidade e orientação sexual
- privação do sono
- gerir trabalho/estudo/responsabilidades domésticas e familiares
- preocupação em terminar o curso e arranjar emprego
- pressão para integrar Instituições de Ensino Superior com médias elevadas
- falta de preparação para lidar com as exigências académicas e maior autonomização
- superproteção dos pais
Assim, torna-se crucial perceber todos os fatores que poderão estar na origem destes índices tão baixos de bem-estar psicológico dos estudantes do Ensino Superior, que incidem mais em jovens do sexo feminino.
Para além do que já foi enunciado sobre a fase de vida específica destes jovens, a experiência vivida durante a pandemia de Covid-19 parece ser um fator muito impactante, bem como os cenários complexos e desanimadores vividos um pouco por todo o mundo: guerra; incertezas económicas e políticas e, por conseguinte, laborais; pressões sentidas pelos jovens nas redes sociais, em que discursos radicais e de ódio têm emergido cada vez mais.
Juntam-se outras condicionantes que começaram a surgir mais nos últimos anos e com impacto pesado e real no bem-estar dos jovens e na sua permanência no Ensino Superior que se prendem com as dificuldades financeiras associadas ao aumento muito significativo do custo de vida, nomeadamente com habitação, propinas, transportes, entre outras.
Um inquérito da Federação Académica do Porto (FAP) relata que, devido a isso mesmo, 24% dos inquiridos refere pensar, ou já ter pensado, em desistir de estudar e, também, 79% dos jovens admitem “um declínio significativo” no seu bem-estar psicológico. A presidente da FAP refere ainda que as IES não conseguem dar resposta a estes dados alarmantes, as listas de espera são longas e em alguns casos pode ser “tarde demais”.
A Fundação Francisco Manuel dos Santos, alerta, num livro sobre o tema do Ensino Superior e Desenvolvimento, que Portugal está a “perder muitos dos seus melhores” estudantes para a emigração. A preocupação com terminar o curso e arranjar trabalho tem um peso forte, visto que, muitas vezes as perspetivas de futuro são muito incertas e indefinidas, seja porque o panorama nacional não parece muito animador, seja porque as escolhas feitas atrás não parecem ter sido bem sustentadas e ponderadas em objetivos futuros de carreira.
De que forma podemos intervir
Deparamo-nos atualmente, com jovens com bons resultados académicos, focados em ter notas para entrar no ensino superior em IES com médias elevadas por perceberem que tal irá influenciar os seus futuros, mas com pouca noção de que caminho querem fazer, se este os irá realizar no futuro e se está de acordo com o seu potencial e perfil de competências. É fácil perceber que entrando no ensino superior, com todas as variáveis indicadas e com a grande exigência intelectual sentida, isso leve à desmotivação, ao isolamento e à apatia em relação ao futuro.
Ora, numa fase em que os jovens deveriam sonhar e ambicionar um futuro melhor a nível pessoal e profissional, a atmosfera sentida torna-se de receio e medo em relação ao futuro e de dúvida em relação às competências que os mesmos possuem para lidar com estas adversidades.
Olhar este problema com o máximo cuidado e atenção é crucial para se intervir o quanto antes e evitar consequências desastrosas na saúde mental, física e nas perspetivas profissionais daqueles que sairão em breve para o mercado de trabalho.
Ainda são poucos os estudantes que procuram ajuda e, muitas vezes, a rede de apoio não tem a perceção dos problemas pelos quais estão a passar, até porque os pares estarão, também, a lidar com o mesmo tipo de situações. Outras explicações poderão dever-se à fraca literacia dos jovens em relação à saúde mental, à importância da intervenção precoce e ao impacto positivo que esta poderá ter e, também, à escassez de serviços ou técnicos de saúde mental disponíveis para o universo de estudantes universitários. Torna-se, assim, muito relevante que estes jovens possam ler e falar mais sobre este tema, por forma a conseguirem contornar outros entraves sentidos, como as questões que se prendem com a privacidade, a discriminação ou vergonha por procurar ajuda psicológica. As instituições que podem prestar apoio, também, devem focar-se e dedicar mais atenção, sobretudo, aos grupos mais vulneráveis e de maior risco, intervindo com estes a diferentes níveis.
Devemos, por isso, estar atentos aos sinais que podem indiciar a necessidade de procura de ajuda profissional e aumentar a literacia relacionada com perturbações psicológicas e doença mental. Se alguns dos aspetos já indicados forem identificados, assim como outros, nomeadamente alterações de comportamento, concentração, tomada de decisão, humor, sono e alimentação significativas, sensação de vazio, medos irracionais e abuso de substâncias são outros indicadores de que poderá ser relevante procurar ou sugerir ajuda profissional.
Trabalhando a saúde mental dos jovens estaremos não só a melhorar a sua qualidade de vida e bem-estar, que lhes permitirá realizar-se de acordo com o seu potencial, sentirem-se úteis para os meios em que se inserem e as suas comunidades e, para além disso, conseguem desenvolver relações sociais significativas, bem como poderão estar mais capazes de integrar e permanecer no mercado de trabalho de forma produtiva e saudável.
Também a importância dos jovens começarem a pensar e a estruturar ações voltadas para a construção do seu desenvolvimento vocacional e profissional, não deixando ao acaso a Gestão da sua Carreira, por falta de motivação, orientação e perspetivas. Aqui podem entrar a exploração direta voltada para o mercado de trabalho (que raramente acontece ainda no ensino secundário), o acompanhamento e orientação vocacional e, mais tarde, a gestão de carreira.
O impacto deste trabalho será sentido nestes jovens adultos que em breve integrarão o mercado de trabalho, mas também nas empresas que verão isso refletido em contextos de trabalho, por um lado, mais saudáveis, felizes e com melhores resultados e índices de produtividade e satisfação e, por outro, menor rotatividade, absentismo e conflitos no local de trabalho.